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Notas Sobre o Feminicídio

A Lei 13.104/2015 instituiu a figura do feminicídio, que nada mais é do que homicídio qualificado, quando a vítima é mulher. Portanto, acrescentou-se o inciso VI ao art. 121, § 2o, do Código Penal, afirmando ser qualificado o crime quando praticado o crime “contra a mulher por razões da condição do sexo feminino”. Surge, então, norma explicativa do que vem a ser razões de condição de sexo feminino, inserindo-se o § 2o-A: “I – violência doméstica e familiar; II – menosprezo ou discriminação à condição de mulher”.

Em primeiro lugar, há de se ressaltar que o Parlamento brasileiro continua míope. Em vez de começar alterando a pena da ameaça e da lesão corporal contra a mulher – os prenúncios do homicídio – chega direto a modificar a pena do delito mais grave, a ínfima parte dos casos. Se o homem fosse efetivamente preso por ameaçar ou lesionar a mulher, muitos homicídios (agora, feminicídios) não ocorreriam.

Outro aspecto interessante é a criação do termo – feminicídio – como se o tipo penal, com seu título jurídico (homicídio), fosse insuficiente. A interpretação feita, de longa data, pela doutrina penal, acerca do homicídio, sempre se cingiu à morte de um ser humano – e não de um homem, pessoa do sexo masculino, até porque o tipo é descrito como matar alguém. Este alguém é homem ou mulher.

Desligamo-nos da técnica para abraçar a demagogia legislativa, hoje tão natural em matéria penal (infelizmente).

Em breve, haveremos de criar o idosicídio, o criancicídio (infanticídio não vale, pois envolve somente recém-nascidos), o adolescenticídio, dentre outros. O homicídio deverá desaparecer para dar lugar a vários tipos penais qualificados ou até desmembrados do art. 121.

Esta nova qualificadora, na prática, elimina a agravante do crime contra mulher (art. 61, II, f, CP) para a eliminação da vida.

Há, ainda, no recém criado § 7o, causas de aumento (de um terço até a metade) se o crime for cometido “durante a gestação ou nos 3 meses posteriores ao parto”; “contra pessoa menor de 14 anos, maior de 60 anos ou com deficiência”; “na presença de descendente ou ascendente da vítima”.

A primeira causa de aumento busca contornar o concurso formal entre homicídio e aborto, o que não nos convence. Matar a mulher grávida, ciente disso, gera ao autor dois delitos em concurso e esta causa de aumento é inaplicável. Quanto à segunda parte, pode-se indagar: “por que nos 3 meses posteriores ao parto”? A criança precisa ser amamentada, pelo menos, 6 meses – e não três. Essa não seria a razão. Logo, é um montante aleatório.

A segunda já está prevista no § 4o, parte final, do art. 121. O que muda, agora, é o seguinte: a) matar homem idoso: aumenta a pena em um terço; b) matar mulher idosa: qualifica e aumenta a pena de um terço até a metade. O mesmo se diga da pessoa menor de 14.

O legislador brasileiro realmente capricha para gerar distorções. Proteger a mulher da violência doméstica e familiar é uma necessidade, mas gerar penas absolutamente desproporcionais fere a própria Constituição. Ilustrando, Fulano mata Beltrano, com 61 anos. Aplica-se a pena de 7 anos (6 anos + um terço). Fulano mata Beltrana, com 61 anos. Aplica-se a pena de 16 anos (12 anos + um terço). Estamos usando o mínimo previsto em lei.

O que acontece para o homem idoso, assassinado, gerar 7 anos para seu matador, enquanto a mulher idosa, identicamente assassinada, produzir 16 anos. O primeiro crime é comum; o segundo, hediondo.

Terminamos estas notas dizendo simplesmente: acho que perdi alguma coisa… Deve haver uma explicação inalcançável para esta pobre mente masculina que ora encerra este artigo.