Desde a edição da Lei 11.340/2006 (Lei Maria da Penha), inúmeras medidas cautelares foram criadas para a proteção da mulher, especialmente as que eram – e ainda são – com frequência agredidas por seus maridos, companheiros e namorados. Mas também por estranhos, que, por serem homens, se julgam fisicamente superiores, considerando as mulheres seres inferiores.
No campo processual, a Lei Maria da Penha é um sucesso; no cenário penal, uma tragédia. Isto porque as penas dos crimes de lesão corporal simples e ameaça – a imensa maioria dos delitos contra a mulher, em particular, no ambiente doméstico – continuam com penas ínfimas, de meses de detenção ou multa.
Vamos ao campo prático. O juiz pode decretar a prisão preventiva contra o agressor, independentemente dos requisitos do art. 312 do CPP, como se encontra previsto no art. 313 do mesmo Código. Mas, se ele decreta a prisão cautelar contra o agressor que responde somente por ameaça, sujeito que se encontra a ser apenado com simples multa, como fica o fenômeno da detração? Como subtrair meses de prisão cautelar de uma mera multa? Impossível.
Mesmo que o agressor se utilize da lesão simples, cuja pena mínima é de 3 meses de detenção, como fazer para compensar o tempo de prisão preventiva, quando esta extravasa para muito mais que esse período? Nada se pode fazer.
Não bastasse tantos desencontros, os Tribunais tem adotado uma posição estranha. Imagine-se que a medida cautelar decretada pelo magistrado seja não se aproximar da vítima. Porém, o agressor se aproxima, não cumprindo a ordem judicial. O correto, com a devida vênia, seria processar o agressor por crime de desobediência. Somente não se pune por desobediência se já houver uma outra sanção para isso. Mas não há.
Entretanto, vários julgados de Tribunais dizem que não cabe o crime de desobediência pois há sanção própria para isso, vale dizer, a prisão preventiva. Esse argumento nos faz pensar que a prisão preventiva deixou de ser medida cautelar, mas passou a ser pena ou sanção.
Ora, imagine-se a seguinte teratologia: por conta de ameaça do companheiro contra a sua mulher, esta consegue ordem de distanciamento; o agressor não respeita a ordem e se aproxima da ofendida; esta reclama à Justiça. O que pode acontecer? Em nossa visão, processar o agressor por desobediência. Na ótica de muitos julgados, a decretação da preventiva. Porém, preventiva não é sanção, mas medida cautelar.
Se a preventiva for decretada nesse caso, o agressor (ameaça) pode ficar preso muito mais tempo do que o máximo previsto para a pena em abstrato quanto ao crime de ameaça (art. 147, CP). Praticamente atira-se no lixo a detração.
Há muitas contradições e erros na aplicação da Lei Maria da Penha. Das duas uma: ou se abstém o juiz de decretar a prisão preventiva sem prazo determinado para crimes menores ou se altera a pena da lesão simples e da ameaça para justificar a prisão cautelar.
É inadmissível que um indivíduo fique preso meses e meses por conta de uma ameaça, cuja pena máxima é de seis meses de detenção ou multa.
Prisão preventiva definitivamente não é sanção penal.