A primeira positiva modificação introduzida pela Lei 12.015/2009 consistiu na alteração do Título VI, que passou à denominação correta: Dos crimes contra a dignidade sexual. Não havia mais sentido, nos dias de hoje, a vetusta nomenclatura de crimes contra os costumes, evidenciando o recato e a moralidade no contexto da sexualidade, incompatíveis com os avanços obtidos nas últimas décadas. Portanto, o que se pretende tutelar é a dignidade sexual, no mesmo prisma da dignidade da pessoa humana, na ótica do Estado Democrático de Direito (art. 1o, III, CF).
Outra modificação relevante diz respeito à unificação, na mesma figura penal (art. 213), dos crimes de estupro e atentado violento ao pudor. Portanto, a partir da edição da referida Lei, qualquer pessoa pode cometer estupro contra qualquer pessoa. Anteriormente, no caso de estupro, somente a mulher poderia ser sujeito passivo. A partir de agora, homens e mulheres podem ser sujeitos passivos desse delito. A conseqüência imediata dessa alteração é a criação de um tipo misto alternativo, ou seja, a prática da violência sexual para obter a conjunção carnal e também outro ato libidinoso dá margem à tipificação apenas em um crime: estupro. Não existem mais dois delitos (estupro e atentado violento ao pudor), mas somente o previsto no art. 213 do Código Penal.
Assim sendo, cuidando-se a Lei 12.015/09 de lei penal benéfica, deve retroagir no tempo, envolvendo todos os fatos cometidos antes de sua vigência. Por isso, quem foi condenado pela prática de estupro e atentado violento ao pudor, contra a mesma vítima, no mesmo contexto, a uma pena mínima de doze anos, poderá pedir a sua revisão, alterando-se para o mínimo de seis.
Outra novidade legislativa consiste na criação do tipo penal do estupro de vulnerável (art. 217-A, CP). A anterior previsão do art. 224, referindo-se à presunção de violência, deixou de existir como norma autônoma, passando a integrar a composição do tipo penal. Assim sendo, ter conjunção carnal ou outro ato libidinoso com menor de 14 anos é crime de estupro contra vulnerável, sujeito à pena de reclusão, de 8 a 15 anos. A vantagem dessa mudança é a cessação do debate em relação à existência, no Código Penal, de norma atuando com a denominação de presunção e funcionando contra os interesses do réu. Não mais existe presunção independente, mas incorporada no tipo penal.
Entretanto, não cremos na cessação do embate doutrinário ou jurisprudencial no tocante ao caráter da vulnerabilidade: se absoluta ou relativa. Permanecemos fiéis à nossa posição de que, em relação ao adolescente, maior de 12 anos, a vulnerabilidade continua relativa, admitindo prova em contrário. Quanto à criança, menor de 12 anos, a vulnerabilidade deve ser considerada absoluta, sem se admitir prova em sentido contrário.
Criou-se, finalmente, o tipo penal destinado a punir aquele que fomenta, de algum modo, a prostituição juvenil. O art. 218-B prevê punição para quem submeta, induza ou atraia o menor de 18 anos (e maior de 14, por questão de lógica, pois o menor de 14 é protegido pelo art. 217-A) à prostituição ou outra forma de exploração sexual, incluindo o cliente desse menor e o proprietário, gerente ou responsável pelo estabelecimento onde o ato sexual se realize.
Arremata-se a discussão sobre a hediondez do estupro, na forma simples, bem como do estupro, quando ocorrido por presunção de violência. Havia quem dissesse não serem essas formas hediondas. O art. 1o, da Lei 8.072/90, passa a ter nova redação, abrangendo, claramente, a previsão do estupro nas formas simples e qualificadas, bem como o estupro do vulnerável, nas formas simples e qualificadas.
Finalmente, a ação penal, nos casos de delitos sexuais, passa a ser pública condicionada à representação da vítima, afastando-se a aplicação da Súmula 608 do STF. Por exceção, a ação será pública incondicionada, quando envolver menor de 18 anos ou vulnerável, nos termos da nova redação dada ao art. 225 do Código Penal.